2ª Parte
Na primeira parte
deste ensaio abordamos dois fatores psicológicos
(aversão ao risco e medo) que levam muitos clientes a
preferirem pagar mais caro por uma marca que inspire
mais CONFIANÇA.
Às vezes, a CONFIANÇA provém de experiências positivas
anteriores com a marca. Nesses casos, ela é objetiva e,
portanto lógica ou racional (consciente).
Outras vezes, a CONFIANÇA é resultante de percepções de
atributos intangíveis. E nesses casos trata-se de um
fenômeno puramente subjetivo, portanto psicológico ou
uma reação (emoção) da nossa mente a determinadas
imagens gravadas ou sentidas.
A questão é que, seja por motivos lógicos ou
conscientes, como por motivos psicológicos ou
inconscientes, muitos clientes preferem pagar mais caro.
Neste texto, vamos abordar mais dois fatores que
costumam levar muitos clientes a preferirem pagar mais
caro.
INTELIGÊNCIA NATURALISTA
Uma das múltiplas inteligências descobertas pelo
psicólogo Howard Gardner é a que ele intitula de
‘inteligência naturalista’, a qual envolve a capacidade
de fazer discriminações no mundo natural entre uma
planta e outra, entre um animal e outro, entre
variedades de nuvens, entre formações rochosas,
configurações de mares, e assim por diante.
Segundo ele, nossos ancestrais não teriam sobrevivido se
não pudessem diferenciar uma planta venenosa de outra
nutritiva, um animal bom para comer de outro do qual
seria melhor fugir imediatamente, etc.
Num nível mais sutil, nossos ancestrais possuíam
capacidades para distinguir variedades de lagartos, de
plantas, arbustos ou rochas.
A nossa sociedade de consumo também depende da
inteligência naturalista para distinguir um tênis de
outro, um automóvel de outro, etc.
Certamente, algumas pessoas têm uma capacidade muito
mais apurada para diferenciar os detalhes entre os
produtos e serviços de uma mesma espécie.
É por isso que quando se pergunta às pessoas qual a
pasta de dente que elas usam, algumas especificam não
apenas a marca, mas também a variedade específica da
marca, por exemplo: ‘Colgate Max Fresh’...
É certo que alguns nem sabem bem o que é esse tal de
‘Max Fresh’, mas outros sim, sabem, porque se interessam
muito pela especificidade dos produtos e serviços que
usam.
Já outros dizem: compro ‘qualquer uma’ ou ‘a que for
mais barata’, porque ‘é tudo a mesma coisa’.
Estes, ou não estão muito preocupados com os dentes ou
(de acordo com a tese da inteligência naturalista) têm
mais dificuldade de perceber as diferenças.
Assim, quanto maior for a ‘inteligência naturalista’ do
cliente, maior será a sua sensibilidade para perceber a
diferença dos detalhes de qualidade entre os diversos
produtos e serviços de uma mesma categoria.
E, se esses detalhes forem valorosos para ele, é bem
provável que se disponha a pagar mais por eles. É claro
que o inverso também é verdadeiro.
Nessa altura você já deve estar se perguntando: ‘pô
Professor, então como eu faço para vender um produto ou
serviço com comprovados diferenciais de qualidade para
um indivíduo que não tem lá grande inteligência
naturalista?’
Calma. Continue navegando neste ensaio comigo que eu vou
te dar algumas pistas que poderão fazer você ‘chegar
lá’.
No caso do cliente que é capaz de diferenciar os
detalhes (que possui inteligência naturalista), a opção
pela marca mais cara tem um componente lógico (de
raciocínio) bastante forte (sempre que falamos em
inteligência, falamos em raciocínio).
Assim, poderíamos mesmo dizer que a compra foi
totalmente consciente.
Certo? Bem, pode ser que sim, mas também pode ser que
não.
Essa compra teria sido totalmente consciente se além de
ele ‘acreditar’ na palavra do vendedor e no material
promocional da empresa (tudo intangível) ele também
tivesse ido atrás para ‘comprovar’ na prática a
veracidade e a efetividade daqueles tais ‘diferenciais
de qualidade’.
Mas, se ele simplesmente ‘acreditou’ no discurso do
vendedor e no material de propaganda da empresa, ou
confiou na empresa devido a conceitos e percepções
anteriores, então não se pode dizer que a decisão de
compra fora exclusivamente racional.
Afinal, ‘acreditar’ é um fenômeno psicológico que exclui
a experimentação empírica ou científica. Portanto, não
tem nada de lógico ou racional nesse proceder.
Talvez o tópico abaixo possa lhe dar uma pista de como
proceder para vender para os clientes sem muita
inteligência naturalista.
TOUCHPOINTS
‘Touchpoints’ é como o marketing define os inúmeros
‘Pontos de Contato’ que o mercado tem continuamente com
a marca da empresa ou, os inúmeros ‘locais onde os
clientes e prospects se encontram’ com a marca.
Se a empresa já existe há algum tempo e tem certa
presença no mercado, então os potenciais clientes já
devem ter tido inúmeros ‘encontros’ com a marca em
vários ‘locais’ como: nos veículos que trafegam pelas
ruas com a logomarca da empresa; com os empregados que
circulam uniformizados; com o material de propaganda
(dos mais diversos tipos e nas mais diversas mídias);
com os comentários em geral, inclusive de clientes e
ex-clientes satisfeitos e insatisfeitos; etc.
Se a empresa for nova ou tiver pouca presença no
mercado, então o primeiro encontro talvez irá se dar
durante o processo de compra.
Agora, o nosso cérebro funciona como uma espécie de
máquina fotográfica que grava a IMAGEM de cada cena que
presenciamos ou percebemos através dos nossos sentidos.
Depois ele pode descartar ou não essas ‘fotos’, segundo
a importância que elas tiverem para nós.
As imagens que mais nos chamam a atenção desencadeiam
uma reação (emoção) no nosso organismo.
O neurocientista António Damásio, um dos mais
respeitados estudiosos do fenômeno das emoções, alerta
para o fato de que numerosas criaturas não humanas têm
emoções em abundância, mas nós somos os únicos seres
que vinculamos as emoções a idéias, valores, princípios
e a juízos complexos.
Assim, se as ‘cenas’ ou ‘fotos’ gravadas nesses
‘encontros’ produzirem emoções positivas, os potenciais
clientes passarão a ter o que os americanos chamam de
‘good will’ ou ‘honorable
intentions’
que poderíamos traduzir para o português como sendo uma
espécie de ‘nobres intenções’ ou ‘boa vontade’ para com
a marca.
Obviamente, esse sentimento gera confiança e resulta
numa ‘valorização’ automática do preço que eles
aceitariam pagar por seus produtos e serviços. Do
contrário,
só aceitarão fazer negócio com ela se o preço for muito
atrativo.
Nesse caso, a aceitação de pagar um preço mais alto teve
componentes conscientes e inconscientes, ou lógicos e
emocionais.
Como se vê, a emoção integra todo processo de raciocínio
e decisão.
Gerald Zaltman dá um exemplo: a fragrância de um perfume
– atributo de um produto – talvez evoque determinada
lembrança no comprador potencial e desencadeie emoções
associadas a ela.
Se a lembrança desencadear emoções dolorosas, o
indivíduo dificilmente comprará o perfume, ainda que a
fragrância, o preço, a embalagem, a marca e outras
qualidades atendam a seus critérios de escolha. O
inverso também é verdadeiro.
Damásio afirma que não é verdade que a razão opere
vantajosamente sem a influência da emoção. Pelo
contrário, segundo ele, é provável que a emoção auxilie
o raciocínio, em especial quando se trata de questões
pessoais e sociais que envolvem risco e conflito, como é
o caso da segurança, por exemplo.
As emoções estão intimamente entrelaçadas com o
raciocínio lógico. E, embora o nosso cérebro possua
estruturas separadas para processar emoções e raciocínio
lógico, os dois sistemas se comunicam entre si e, em
conjunto,
afetam nosso comportamento.
Mais importante ainda: o sistema emocional, o mais
antigo dos dois em termos de evolução, geralmente exerce
a primeira
força sobre o nosso processo mental e sobre o nosso
comportamento.
Todavia, quando razão e emoção entram em conflito, a
emoção sempre acaba levando vantagem, porque enquanto a
razão se preocupa com deduções e induções lógicas, a
emoção é a que leva à ação.
Numerosos estudos têm demonstrado que indivíduos
inteiramente racionais que sofrem lesões neurológicas em
locais específicos do cérebro, perdendo determinada
classe de emoções, também perdem a capacidade de tomar
decisões racionais. Muitas de suas decisões pessoais e
sociais passam a ser irracionais e na maioria das vezes
desvantajosas para eles próprios e para as outras
pessoas.
É comum acreditar-se que os clientes tomam decisões
deliberadas e de maneira lógica.
Zaltman, diz que isso é exceção e não regra. Que a
seleção é relativamente automática e decorre de hábitos
e de outras forças inconscientes, sofrendo enorme
influência do contexto social e físico dos compradores.
Maurice Levy, chairman do Publicis Groupe, diz que as
pessoas buscam uma razão lógica para comprar (o que o
produto oferece e por que é uma escolha superior), mas
tomam uma decisão emocional (gosto dele, prefiro ele, me
sinto bem com ele, etc.).
Kevin Roberts, CEO mundial da Saatchi & Saatchi, afirma
que os consumidores que tomam decisões com base
puramente em fatos representam uma ínfima minoria da
população mundial. A grande maioria consome e compra com
a mente e com o coração, ou se você preferir, com as
“emoções”.
Para ter mais chances com o comprador, é preciso mesclar
as características e benefícios racionais com os
benefícios emocionais nas apresentações de vendas,
porque se uma idéia não tiver significado emocional para
nós é provável que não a armazenemos e, portanto, que
não a tenhamos disponível para lembranças no futuro.
Na realidade é preciso traduzir as características e os
benefícios racionais para a forma como os clientes
respondem ‘emocionalmente’ às necessidades que serão
satisfeitas por esses benefícios.
Como mencionamos na primeira parte deste estudo, as
empresas e os vendedores costumam concentrar 90% de seus
esforços nas características e benefícios racionais dos
produtos e serviços (preço...) e se esquecem dos
benefícios emocionais.
Embora importantes, os benefícios racionais representam
apenas pequena parte do que realmente impulsiona a
compra, porque as pessoas não costumam comprar baseadas
apenas em argumentos lógicos, ou somente em argumentos
lógicos.
Quando se trata de comprar, 95% do processo de compra é
puramente inconsciente. Por isso, mais de 70% das
compras são por puro impulso.
Como você viu, por diversos motivos racionais e/ou
emocionais, muitos clientes preferem pagar mais caro por
uma marca que lhes inspirem mais confiança ou que lhes
agradem mais.
Também, como você acabou de ver, os clientes e prospects
avaliam a marca através dos inúmeros ‘touchpoints’,
pontos de contato ou encontros que eles têm
continuamente com a marca.
Se esses encontros forem positivos, eles passarão a
confiar mais na marca e estarão mais dispostos a pagar
um preço maior por ela.
No próximo capítulo vamos continuar analisando esse tema
dos benefícios racionais e emocionais.
Prof. Faccin
professor@faccin.com.br
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