Modelo de rentabilidade e
desempenho no setor, a TIM foi seduzida pelo consumidor de
baixa renda. Deu tudo errado Por Carolina
Meyer para a revista Exame
EXAME Desde que começou a
oferecer cobertura nacional no Brasil, em 2002, a TIM,
segunda maior operadora de celulares do país, vinha
colecionando números invejáveis. Pioneira na implantação
da tecnologia GSM, a empresa era dona da carteira de
clientes mais rentável do setor, com uma receita por
usuário quase 20% superior à das concorrentes Vivo e
Claro. A liderança no mercado corporativo garantiu-lhe a
mais alta rentabilidade entre as operadoras de celular: em
torno de 30%. E a TIM, que já teve como garotos-propaganda
o craque Ronaldo e a modelo Daniela Cicarelli, então no
auge de suas carreiras, chegou a estar entre as marcas
mais admiradas do país. Enquanto outras operadoras de
celular se debatiam para resolver problemas como clonagem
de linhas e falhas nos sistemas de cobrança, a TIM
crescia. Entre 2004 e 2007, seu valor de mercado passou de
pouco mais de 3 bilhões para 16 bilhões de reais. Com tais
credenciais, a empresa parecia vestir uma couraça à prova
de contratempos. Claro, a couraça não existia, como ficou
evidente nos últimos meses. No primeiro trimestre deste
ano, de forma surpreendente, a TIM registrou prejuízo de
108 milhões de reais, o pior da história para essa época
do ano. Diante do mau desempenho, a operadora reviu para
baixo sua meta de crescimento para 2008: de 12% para 9%.
Foi a senha para que o mercado jogasse suas ações para
baixo. Nos últimos três meses, os papéis da TIM caíram
quase 25%. “O mercado estava acostumado a números
excepcionais”, diz Mário César Araújo, presidente da TIM.
“Nem sempre podemos entregar os resultados esperados.”
A diferença entre realidade e expectativa costuma ser um
problema para todas as empresas, independentemente do
setor em que atuem. Tais expectativas podem ter
fundamentos ilusórios. Mas os resultados sempre têm causas
reais. No caso da TIM, o motivo dos maus números atende
pelo nome de mercado de baixa renda. Com o objetivo de
ampliar a base de usuários nessa faixa da população, a TIM
lançou-se numa série de campanhas de marketing agressivas.
Entre elas estava a promoção que oferecia ligações a 7
centavos por minuto e que rapidamente se tornou um
sucesso. O número de adesões superou em 30% o esperado
inicialmente, segundo executivos ligados à empresa. O
problema é que nem todos esses novos clientes se mostraram
bons pagadores. As despesas com clientes inadimplentes
somaram 271 milhões de reais no primeiro trimestre deste
ano, aumento de 57% em relação ao mesmo período de 2007 e
quase o triplo do registrado pela Vivo, sua principal
concorrente. “Acabamos atraindo uma enorme quantidade de
maus pagadores. Foi um erro”, diz Araújo. A mesma
estratégia de atrair clientes de menor poder aquisitivo
fez a TIM mergulhar no mercado pré-pago. A empresa criou
promoções para a venda de chips e bônus em ligações a
partir de 100 reais. As duas coisas juntas — serviços
baratos e produtos pré-pagos — renderam à TIM 1,3 milhão
de novos clientes, mais de um terço deles pertencente às
classes C e D. Mas, quanto mais crescia a base de
compradores, maior ficava o buraco financeiro. A receita
por usuário caiu 14% e a margem Ebitda passou de 27% para
17,9%, a menor entre as grandes operadoras. “As operadoras
estão fugindo do pré-pago por causa da baixa
rentabilidade. A TIM foi na contramão”, afirma o analista
de um grande banco de investimento.
Além de decepção, os números
apresentados pela TIM causaram no mercado uma sensação de
desconfiança. Isso porque, em geral, as margens das
operadoras no primeiro trimestre costumam ser melhores que
aquelas verificadas no quarto trimestre do ano anterior.
Trata-se de uma lógica desse mercado. Para impulsionar as
vendas de Natal, as companhias de celular aumentam
investimentos em publicidade, gastos com comissões de
vendas e subsídios de aparelhos e tarifas, o que corrói
sua rentabilidade. E, como nesse período a meta é
adicionar novos clientes a qualquer custo, os índices de
inadimplência também costumam ser levemente maiores. Com a
TIM ocorreu algo inusitado. A companhia apresentou bons
resultados no final de 2007: margem Ebitda de 27% e gastos
com inadimplência de apenas 2,9% da receita de serviços
(ante 9,5% no trimestre anterior). Nos primeiros três
meses deste ano, no entanto, a situação se inverteu.
Enquanto a margem Ebtida caiu, os gastos com inadimplência
atingiram 9,6% da receita de serviços. Um relatório
recentemente publicado pelo departamento de análises do
Unibanco levanta a hipótese de que a operadora tenha
adotado essa estratégia para atender às expectativas da
matriz italiana. “É natural que uma empresa queira agradar
à matriz, especialmente se ela estiver enfrentando
mudanças. Mas isso, às vezes, vem com um preço”, afirma
Betânia Tanure, especialista em governança corporativa da
Fundação Dom Cabral.
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Oficialmente, a TIM nega que tenha alterado sua
estratégia por pressão dos italianos. Mas a conturbada
situação da matriz vem, como era esperado, afetando a
administração da subsidiária brasileira. Em abril de
2007, o controle da Telecom Itália foi adquirido por
um consórcio formado pela família Benetton, pelos
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bancos italianos Mediobanca e
Intesa San- Paolo, pela seguradora Generali e pela
espanhola Telefónica. A esse fato, seguiu-se uma série de
especulações acerca dos executivos que comandariam a
operação — tanto em Roma como no Brasil. Em apenas sete
meses, mais de dez nomes chegaram a ser cogitados para a
presidência do conselho de administração e para o posto de
diretor executivo. Por várias vezes, chegou-se a falar na
venda da subsidiária brasileira como forma de quitar parte
das dívidas da matriz, que chegam a 35 bilhões de euros.
Em meio a esse clima de indefinição, a operação brasileira
acabou paralisada. O cenário só começou a desanuviar no
final de 2007. Em outubro, a Anatel, agência reguladora do
setor, determinou que as operações da TIM e da Vivo, que
têm 50% do controle nas mãos da Telefônica, deveriam
permanecer completamente separadas (até então, a matriz
trabalhava com a possibilidade de convergência das duas
empresas, o que retardava decisões de investimento). Ao
mesmo tempo, a indicação de Gabriele Galateri à
presidência do conselho da TIM mundial e de Franco Bernabé
ao posto de presidente, em dezembro, encerrou as
especulações sobre o novo comando da matriz.
Somente quando a situação na
Itália se definiu é que Araújo pôde finalmente se dedicar
aos pormenores da operação, até então relegados a segundo
plano. Para reverter o fraco desempenho da companhia no
primeiro trimestre, ele decidiu atacar em duas frentes. A
primeira foi estancar a evasão de receita. A promoção que
oferecia ligações a 7 centavos por minuto, uma das grandes
responsáveis por derrubar a rentabilidade da empresa, foi
suspensa em fevereiro. A TIM também passou a exigir
comprovantes de pagamento de contas antigas de clientes
vindos de outras operadoras, como forma de se resguardar
de maus pagadores e diminuir os gastos com inadimplência.
“São medidas um tanto óbvias, mas que acabaram passando
despercebidas pela companhia”, afirma Raul Aguirre,
presidente da consultoria AT Kearney e especialista em
telecomunicações. “Dada a extrema competição do setor,
qualquer custo ou gasto extra, por menor que seja, pode
comprometer o desempenho de toda a operação.” Na outra
ponta, Araújo tem tentado ampliar a oferta de serviços
capazes de gerar mais receita para a companhia, como a
transmissão de dados por celular. Para isso, a operadora
investiu 1,3 bilhão de reais na aquisição de licenças 3G
no final do ano passado. O serviço começou a ser oferecido
no dia 16 de abril e a expectativa é que a receita com
essa nova tecnologia supere 500 milhões de reais até o
final deste ano.
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Mesmo que consiga colocar a companhia de volta nos
trilhos já no próximo trimestre, Mário César Araújo
ainda tem pela frente algumas provas a vencer. A mais
importante delas é convencer a matriz de que a
operação brasileira será um negócio rentável no longo
prazo — o que pode, em última análise, definir o
futuro da empresa aqui. Depois de ter seu crescimento
revisto para baixo em 2008, são cada vez mais remotas
as chances de a TIM cumprir a meta de rentabilidade
prevista para este ano, de 23%. Isso porque as
promoções responsáveis por drenar os lucros da
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operadora nos primeiros três meses
do ano ainda devem contaminar os resultados do segundo
trimestre. Além disso, o acirramento da competição,
proporcionado pela entrada da Oi em São Paulo e pela
chegada da Vivo ao Nordeste, dois dos principais mercados
da TIM, deve pressionar ainda mais as margens da
companhia. Para complicar, a adoção da portabilidade
numérica, prevista para agosto, deve facilitar a migração
de clientes para outras operadoras. “Os controladores são
muito exigentes em relação a números”, afirma um executivo
da TIM. “Sem cumprir as metas acertadas com a matriz, a
viabilidade da operação no Brasil será posta em xeque.” O
desafio imediato de Araújo é proteger seu rei do cerco.
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