José Pastore*
Ia escrever sobre o fim da contribuição sindical e as
regras das greves dos servidores públicos. Mas há um
problema que me tira o sono. Vou direto ao ponto. Tomei
conhecimento de que alguns sindicatos laborais não
querem que as empresas premiem os melhores empregados
porque isso constitui um gesto de exclusão social. Ao
destacar uns, menosprezam os demais.
Contou-me uma professora que a escola onde leciona
acabou com a premiação dos melhores alunos, porque isso
foi considerado pelas ONGs do bairro como um ato de
discriminação. Sim, porque as atitudes que enaltecem o
virtuoso são incompatíveis com o esforço de inclusão
social.
Quando se diz que 'o Brasil é um país de todos', temos
de entender que ninguém pode ser ofuscado pelo brilho
dos outros. Absurdo! Dados de uma pesquisa recente
revelam que a maior parte dos indicados pelo PT para os
cargos de confiança na administração pública não tem
preparo adequado.
Os melhores são os que trabalham na área econômica.
Mesmo assim, apenas 27% têm formação compatível com suas
responsabilidades. Na área da saúde são apenas 19%. Na
da educação, 14%. E nas áreas sociais, em que há a
grande concentração de filiados do partido, a maioria
não tem nível universitário e, muitas vezes, nem nível
médio (Celina D'Araujo, Governo Lula: contornos sociais
e políticos da elite do poder, Centro de Pesquisas e
Documentação Histórica, Fundação Getúlio Vargas, Rio de
Janeiro, 2007).
Muitos dos ocupantes desses cargos devem estar prontos
para argumentar que os intelectuais que estiveram em
posições de destaque na vida da República não
conseguiram fazer o Brasil pagar a dívida externa,
acumular tantos dólares e reduzir a pobreza. Sem querer
contra-argumentar que os resultados de hoje são frutos
dos esforços de ontem, devo dizer que minha preocupação
decorre do fato de que o mérito se relaciona com a
eficiência das instituições e da economia.
Tenho certeza de que o leitor tem no bolso inúmeros
exemplos de graves ineficiências da máquina pública. Da
minha parte, citarei apenas um, na área do meio
ambiente. O prazo legal para a concessão de uma licença
ambiental pelo Ibama é de 30 dias; no governo Lula está
demorando 394 dias. A aprovação de um EIA-Rima, que
deveria ser feita em 60 dias, consome 576 dias. A
realização de uma audiência pública sobre questão
ambiental, que deveria ocorrer em 45 dias, leva 239
dias.
E uma licença prévia, que deveria ser concedida em 270
dias, leva 1.188 dias! (Dados referentes a 63
empreendimentos licenciados pelo Ibama entre 1997 e 2006
e coletados pelo Banco Mundial.) O mínimo que se pode
dizer é que essa demora comprometerá os projetos do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e os
investimentos futuros.
Crescimento acelerado e sustentado depende de boa
governança nos setores público e privado. Não basta ter
um quadro inchado. Obesidade é doença. O que interessa é
contar com pessoal de qualidade, competência,
comprometimento e que toma decisões tempestivas. Quando
premiar é visto como exclusão social e carteirinha vira
passaporte para bons empregos, a situação é grave.
O comunismo ruiu porque desprezou a eficiência. Só isso.
O fracasso das 70 safras agrícolas durante os 70 anos de
comunismo se resume numa palavra: ineficiência. Foi o
resultado da troca do mérito pela hegemonia da
nomenklatura. Entre nós, a economia vai bem, mas os
valores vão mal. Que estímulos terão as crianças que
estão na escola hoje, e no trabalho amanhã, se o
glorioso é tratar os incompetentes como iguais? Muitos
dos meus alunos já perguntam: professor, por que devemos
estudar tanto se os que decidem sobre nossas vidas são
tão pouco preparados? O caso é sério porque, no mundo
cada vez mais competitivo, o que se espera dos
profissionais é que, além de serem bons nos seus
ofícios, sejam zelosos no que fazem, tenham amor pelo
bem-feito, assumam responsabilidades pelos seus erros,
estejam prontos para corrigi-los, respeitem os que se
destacam, enfim, estejam convictos de que sua realização
pessoal, e da própria nação, depende muito do empenho,
da qualificação e de ética no trabalho. Triste é o mundo
que despreza essas virtudes. Condenado é o país que
inverte esses valores. Frustrado é o ser humano que vê a
competência substituída pelo crachá. Não é isso que
desejo para os meus netos.
*José Pastore é
professor da FEA-USP. Site:
http://www.josepastore.com.br
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