Por Fernando Reinach*
É fácil observar que a prática de exercícios aumenta o tamanho dos
músculos e que a atividade cerebral leva ao acúmulo de
conhecimentos em nossa mente. Apesar disso, a maioria
das pessoas não acredita que o simples ato de pensar
possa realmente alterar a estrutura do cérebro. Um dos
experimentos clássicos que demonstra esse fenômeno
envolve o aprendizado da arte de tocar piano.
No cérebro existem duas áreas que controlam o movimento dos dedos,
sendo uma para cada mão. O tamanho dessas áreas, que
reflete o número de neurônios envolvidos na tarefa, pode
ser medido através da utilização de um equipamento capaz
de detectar a atividade elétrica na região cerebral. Foi
utilizando este equipamento que os cientistas decidiram
verificar o que ocorria quando uma pessoa aprendia a
tocar piano.
Um grupo de voluntários foi colocado em frente ao piano e foi
solicitado que praticassem ao instrumento, duas horas
por dia, durante cinco dias, uma seqüência de notas que
exigia a utilização dos cinco dedos da mão direita. O
objetivo era não cometer erros e seguir o ritmo de um
metrônomo, um aparelho que regula o andamento das
músicas.
Em cinco dias, todos os “alunos”, que inicialmente trocavam as
notas e erravam o ritmo, foram capazes de aprender a
tocar a seqüência sem erros e seguindo o ritmo. A cada
dia, o tamanho da área do cérebro responsável pelo
controle dos movimentos dos dedos era medido. À medida
que as pessoas melhoravam sua habilidade no piano, a
área que controla os movimentos da mão direita foi
aumentando, enquanto a área responsável pelo controle da
mão esquerda não se alterou. Isso demonstra que, quando
utilizamos uma parte do cérebro intensamente, ocorrem
modificações nessa área de um modo a acomodar
adequadamente a nova tarefa.
Não satisfeitos, os cientistas resolveram verificar se é necessário
executar o movimento para que as alterações ocorram ou
basta imaginar o movimento. Nesse experimento, os
voluntários foram submetidos à mesma rotina, mas foram
instruídos a deixar as mãos imobilizadas sobre a perna e
somente imaginar que estavam praticando com a mão
direita enquanto ouviam o metrônomo e olhavam para o
teclado, tudo sem mover os dedos.
Para garantir que eles não movessem as mãos, foram colocados
eletrodos que alertavam os cientistas se os voluntários
tentavam mover os dedos. Depois de praticar mentalmente
durante cinco dias, duas horas por dia, a área que
controla os movimentos foi medida. O surpreendente é que
a área do cérebro que controla a mão direita aumentou de
tamanho mesmo na ausência de movimentos, demonstrando
que somente o ato de imaginar o movimento da mão é capaz
de alterar a estrutura do cérebro.
Como era de se esperar, não foi observada nenhuma alteração na área
que controla a mão esquerda. Esse experimento foi um dos
primeiros a demonstrar que o simples ato de pensar
intensamente e de maneira repetitiva também é capaz de
provocar alterações na estrutura de nosso cérebro.
As implicações desta descoberta são enormes. Atualmente, muitos
cientistas acreditam na possibilidade de utilizar
exercícios mentais para modelar nosso cérebro, da mesma
forma que utilizamos as academias para modelar nossos
músculos. Ainda não se sabe se essas técnicas são
efetivas no tratamento de doenças mentais.
Mais informações em
Modulation of Muscle Responses Evoked by Transcranial
Magnetic Stimulation During the Acquisition of New Fine
Motor Skills, no Journal of Neurophysiology, volume 74,
página 1.037, 1995.
*fernando@reinach.com
Biólogo
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