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E a dívida só cresce...
 

Suely Caldas para o Jornal O Estado de São Paulo
 
No Brasil a palavra amortização desapareceu do dicionário. Quer deixar o credor feliz, avise-o que vai rolar, não amortizar a dívida. Quer ver devedor sofrer é fazê-lo pagar juros indefinidamente, torná-lo refém do credor e dos juros. Como quem enxuga gelo. Dívida é feita para rolar, não para pagar ? é frase que encanta os ouvidos dos banqueiros, que lucram cobrando juros. Mas no Brasil, se o devedor é o governo, a frase é igualmente bem-vinda, porque os governos preferem usar as sobras do Orçamento com gastos que lhes deem dividendos políticos e eleitorais a amortizar dívida e reduzir despesas com juros.

Por isso a dívida pública não para de crescer. Segundo o Banco Central (BC), entre dezembro de 2006 e maio de 2010, a dívida bruta saltou 49%, de R$ 1,336 trilhão para R$ 1,991 trilhão, e hoje equivale a 60,1% do PIB. Logo, logo ultrapassa R$ 2 trilhões. Já a dívida líquida aumentou só 29%, de R$ 1,091 trilhão para R$ 1,407 trilhão, e, em maio, era 41,4% do PIB. Mas, se é a mesma dívida, por que não evoluem iguais? É que o governo Lula anda exagerando nos dribles estatísticos, com empréstimos a bancos públicos e estatais não incorporados na dívida líquida. Se usasse o conceito de dívida bruta, que embute essas operações e hoje é mais respeitado no mundo, constataria que a brasileira, equivalente a 60,1% do PIB, é bem mais elevada do que a média de 43% do PIB dos países emergentes. Veja os dribles pelos números do BC:

Em dezembro de 2006 os créditos do governo federal junto ao BNDES somavam R$ 9,953 bilhões. Em maio de 2010 deram um salto impressionante de 2.012%, para R$ 210,229 bilhões. Ou seja, o BNDES passou a ser financiado com endividamento do Tesouro, em três operações que somaram R$ 202,5 bilhões, não saíram do Orçamento, não foram votadas pelo Legislativo, premiaram o setor privado com juros subsidiados e o contribuinte pagou a conta.

Em dezembro de 2006 os créditos do governo a bancos oficiais (Banco do Brasil e Caixa Econômica) somavam R$ 12,343 bilhões. Em maio de 2010 eram R$ 230,101 bilhões, um salto extraordinário de 1.816%. Novamente, é dívida do Tesouro financiando o setor privado com juros subsidiados.

Com isso os créditos dribladores são zero, na dívida líquida, e já representam 22% da bruta.

A saúde financeira de um país é medida por indicadores econômicos, como o tamanho da dívida e sua capacidade de pagamento. E débitos só diminuem amortizando seu estoque. Ao reduzir sua dívida, o país paga juros mais baixos em empréstimos externos e é bem avaliado como receptor de investimentos produtivos. Ou seja, além de progresso econômico, amortizar a dívida alivia a despesa com juros e o país respira a sensação de não estar jogando dinheiro fora. Mas há momentos apropriados para reduzir a dívida. É quando a economia cresce, o emprego e a renda prosperam, a receita tributária dispara e sobra dinheiro no Orçamento.

Era final de 2005, e a economia voltou a crescer, navegando na boa maré mundial. Foi quando o governo Lula arquitetou um plano de ajuste fiscal de longo prazo que implicava também amortizar sua dívida. Preparado pelo ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e o atual do Planejamento, Paulo Bernardo, o plano deveria durar dez anos e tinha por metas reduzir gastos do governo, garantir superávits primários crescentes, amortizar a dívida e abrir caminho para um crescimento econômico livre de riscos. Mas a ideia foi bombardeada pela hoje candidata do PT, Dilma Rousseff, que desqualificou o plano dos ministros, o classificou de "rudimentar" e disse que o presidente Lula não o aprovaria.

Em outubro de 2005 o superávit primário estava em 6,1% do PIB, acima da meta de 4,25%. Gastar e reduzir o superávit virou questão de honra para a ministra. E aí o governo repetiu o que sabe fazer bem: gastar mal. As sobras do superávit foram aplicadas numa operação tapa-buracos nas estradas, que as chuvas de verão trataram de destruir dois meses depois. Palocci caiu, Dilma ganhou a briga, o governo seguiu gastando mal e pagando juros que só crescem.

JORNALISTA E PROFESSORA DA PUC-RIO


 
 
 

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