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Ludopédio no gramado
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Economista Maílson da Nóbrega |
"O uso de estrangeirismo costuma
enriquecer o idioma. Amplia o vocabulário. Contribui
para simplificar a linguagem. Facilita a comunicação e a
exposição de idéias. O inglês é um bom exemplo"
Se o governador Roberto Requião vivesse e pudesse
fazer a lei no fim do século XIX – quando o futebol
chegou ao Brasil –, a palavra poderia não existir entre
nós, dadas as complicações da norma. Nas propagandas, o
vocábulo football teria de ser traduzido para o
português. Ao seu lado apareceria ludopédio (futebol,
segundo o dicionário Houaiss).
É assim que reza projeto recentemente aprovado pela
Assembléia Legislativa do Paraná, por proposta do
governador. Obriga a tradução de palavras de outros
idiomas em propaganda no estado. O objetivo, segundo
Requião, é "o reconhecimento e a valorização da língua
pátria". A base seria o princípio da soberania nacional
(artigo 1º da Constituição).
Se a regra fosse nacional e existisse naquela época,
haveria que encontrar tradução para termos ingleses hoje
incorporados ao mundo do futebol: esporte, time, gol,
drible, craque. O jeitão de ridículo de ludopédio talvez
se tornasse familiar. Isso aconteceu com escanteio e
impedimento, que substituíram corner e off-side.
O paranaense Coritiba teria outro nome. Seu título
oficial é Coritiba Foot Ball Club (www.coritiba.com.br)
. Seria complicado traduzir as três palavras inglesas em
propaganda. Procuradores poderiam questionar o seu uso
na fachada da sede do Coritiba. Melhor chamar-se
Sociedade Recreativa Coritiba de Ludopédio.
O mesmo xenofobismo está na base de projeto de lei do
deputado federal Aldo Rebelo. Pela proposta, toda e
qualquer palavra ou expressão em língua estrangeira
usada no território nacional ou em repartição brasileira
no exterior teria de ser substituída "por palavra ou
expressão equivalente em língua portuguesa no prazo de
noventa dias a contar do registro da ocorrência".
Haveria umas poucas exceções.
A absorção de palavras estrangeiras é típica das línguas
vivas e fruto do intercâmbio de bens, serviços, pessoas
e idéias. O mesmo ocorreu na dominação estrangeira, como
na introdução forçada do latim pelos romanos e de
línguas européias pelos impérios coloniais, incluindo o
português no Brasil. Durante mais de dois séculos depois
da conquista da Inglaterra pelos normandos (1066), o
francês foi a língua oficial da corte.
O uso de estrangeirismo costuma enriquecer o idioma.
Amplia o vocabulário. Contribui para simplificar a
linguagem. Facilita a comunicação e a exposição de
idéias. O inglês é um bom exemplo. Aberto à influência
externa, ganhou inúmeras palavras durante as invasões
romana (o nome da capital vem do latim Londinium) e
normanda. E importou milhares do idioma de países que
dominou e de muitos outros.
Apenas 20% a 30% das 80 000 palavras inglesas
dicionarizadas pertencem às suas origens saxônicas. O
francês, que teria contribuído com parcela semelhante,
está muito presente nas artes e na culinária. O latim
está nas ciências e o grego, na medicina (como também
ocorre em outras línguas). Palavras espanholas,
italianas, russas, indianas e outras integram o
vocabulário inglês. O português chegou direto com bossa
nova, cobra e piranha ou por adaptação com cashew
(caju), manioc (mandioca) e mulatto (mulato).
O português se beneficiou de muitos vocábulos
estrangeiros. Nem nos damos conta de que o francês nos
trouxe ateliê, atachê, bufê, cinema, filé, perfume,
sutiã. O inglês nos forneceu xampu, nomes de esportes
(além do futebol, beisebol, voleibol, basquetebol,
handebol, golfe, tênis), bife, buldogue, zíper,
estresse. Se houvesse a Lei Requião, como seriam
traduzidas a italiana pizza, a árabe esfirra e a
espanhola paella?
A tecnologia continua a trazer estrangeirismos, que os
jovens adotam rapidamente e os adultos, mais tarde.
Mesmo quando há correspondentes em português, a
preferência é importar e aportuguesar termos ingleses:
deletar, atachar, inicializar. Deletar, que está no
Aurélio, é mais um vocábulo de raiz latina (delere) no
idioma de Shakespeare.
Em Portugal, o mouse do computador é rato mesmo. O que
ganhariam os paranaenses se nas propagandas aparecesse
rato ao lado de mouse? Nada. A Lei Requião é, pois, uma
tremenda tolice. Ela não reforçará a soberania nacional.
Significará apenas aumento de custos, perda de tempo e
falta do que fazer. |
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