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Migração e emprego na Espanha

18/3/08

José Pastore*

A contenda entre Brasil e Espanha reflete o grave dilema que vive a Europa. O Continente enfrenta os sérios problemas da baixa natalidade e do envelhecimento acelerado da sua população.

É verdade que, no mundo inteiro, os países envelhecem. Mas há diferenças entre eles. Em 2050, a média de idade dos americanos, por exemplo, será de apenas 36 anos. Entre os europeus, será de 53 anos. É uma distância colossal. A proporção de americanos com mais de 65 anos na força de trabalho será de 40%, enquanto a de europeus será de 60%, com graves conseqüências para o déficit previdenciário.

A Europa precisa desesperadamente de migrantes. Eis o dilema. O terrorismo aumentou a suspeita em relação à gente estranha. As insurreições ocorridas na Espanha e na França soaram como ameaça. O esfriamento da economia da Espanha agravou o quadro.

O consumo privado espanhol, que aumentou 4,2% em 2005, crescerá apenas 2,7% em 2008. A formação bruta de capital, que cresceu 6,9% em 2005, aumentará apenas 1,2% em 2008. O crescimento econômico será de cerca de 3%, e o desemprego, de mais de 8% em 2008, encerrando, assim, um longo período de economia crescente e desemprego cadente.

Com isso, a Espanha se fecha. Isso ocorre em toda a Europa, o que é intrigante, pois a alma da idéia da Comunidade Européia era o livre trânsito das pessoas. Hoje, o medo dos imigrantes é visível e fala mais alto. Ora são motivos religiosos ou culturais, ora são razões econômicas e sociais.

A xenofobia se generaliza. Por todos os lados, dificulta-se cada vez mais a entrada de estrangeiros. Quando entram para trabalhar, mesmo os bem-educados são obrigados a aceitar contratos por prazo determinado. É exatamente aqui que se dá uma competição furiosa com os trabalhadores locais. Sim, porque, com uma força de trabalho de 22 milhões de pessoas, há cerca de 6 milhões de espanhóis trabalhando com contratos temporários.

O primeiro-ministro espanhol, José Luis Zapatero, que já foi mais liberal para com os imigrantes, decidiu mostrar os dentes a todos os que, apesar de estrangeiros, poderiam ameaçar seus votos. Foi mais ágil. Endureceu com os imigrantes e ganhou a última eleição.

Paradoxalmente, os estudos mostram que, nos últimos dez anos, os imigrantes foram o fator principal do progresso da Espanha. Entre 1995 e 2005, cerca de 79% do crescimento demográfico foi por causa da imigração (Carlos Alfieri, Spain: Immigrants make the economy grow, IPS - International Press Service, 30/8/07).

A política atual da Espanha e de toda a União Européia é atrair profissionais altamente qualificados e rejeitar os não qualificados. Os requisitos de entrada para os primeiros foram flexibilizados. Para os demais foram enrijecidos. (Christina Boswell, Migration in Europe, Global Commission on International Migration, Genebra, 2005).

Não há nada de pessoal contra os brasileiros que foram deportados da Espanha. As autoridades espanholas devem ter interpretado a tentativa de entrada dos estrangeiros como uma ameaça à luta cerrada que se dá no mercado de trabalho. A posição do governo foi firme e continuará assim. Só entra quem é absolutamente necessário. Para os demais, procuram-se penas nos ovos para evitar a entrada. A ação diplomática é útil, mas é ilusório que ela consiga anular as causas acima indicadas.

Resta saber por quanto tempo a Espanha e os países da Europa poderão dispensar a colaboração dos migrantes, em especial a dos menos qualificados. Para manter essa posição, muitas modificações terão de ocorrer nos hábitos dos povos, porque, hoje em dia, poucos são os que se submetem a trabalhos braçais e de baixa qualificação. A maioria quer manter-se na dolce vita das jornadas reduzidas, que permitem parar de trabalhar ao meio-dia das sextas-feiras e nas férias prolongadas dos meses de julho e agosto. Enfim, o estancamento da migração terá um custo social para quem cultiva o conforto atual.

Alguns sinais dessa mudança já começaram a surgir, em especial na Alemanha, onde os contratos de trabalho estão sendo renegociados, com ampliação de jornada pelo mesmo salário. É provável que esse movimento se alastre. Mas, no longo prazo, vai faltar gente e os países vão precisar de estrangeiros. Quem viver verá.



*José Pastore é professor da FEA-USP. E-mail: jpjp@uninet.com.br
Site: www.josepastore.com.br
 

 

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