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Na escola, mas analfabetos
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Editorial publicado no jornal O Estado de São Paulo em
27-09-08
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Se o estudo recém-divulgado pelo
IBGE, em vez de se chamar Síntese de Indicadores Sociais
se chamasse Síntese de Indicadores de Futuro, talvez
ajudasse o País a se dar conta do que o espera se o mais
crucial desses indicadores no mundo contemporâneo - a
educação - continuar a ser, no Brasil, a catástrofe que as
pesquisas revelam com desalentadora regularidade.
Fala-se em futuro não porque as escabrosas
deficiências do ensino já não venham emperrando a
modernização nacional e a expansão dos nossos setores
econômicos de ponta. Mas sobretudo porque, na era da
revolução tecnológica permanente e globalizada, sem a
superação acelerada do atraso educacional a distância
entre o País e as “sociedades do conhecimento” só tenderá
a aumentar.
O resultado previsível será o encolhimento da
participação relativa do Brasil no intercâmbio
internacional dos bens e serviços de alto valor agregado -
o que faz a riqueza das nações neste século 21.
Diga-se desde logo que a educação de massa, no
Brasil, já foi pior. Avançou-se enormemente na última
década em matéria de universalização do acesso à escola.
Do mesmo modo, o desempenho do sistema de ensino melhorou,
embora de forma muito desigual.
Mas, a exemplo do que ocorre em tantos outros
aspectos da realidade do País, como a mais recente
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) tornou
a comprovar, também na educação se avança a passos
exasperantemente lentos - seja em relação às necessidades
da população, seja em relação ao ritmo do progresso nas
outras nações com as quais o Brasil deve ser cotejado.
Entram governos, saem governos, e o poder público
não consegue concentrar pelo tempo devido programas
prioritários, recursos focalizados e políticas de gestão
eficazes ali onde se trava de fato a mais decisiva das
batalhas na frente da educação - o ensino fundamental.
As conseqüências estão nos novos números do IBGE. O
Brasil tem 2,4 milhões de crianças analfabetas na faixa de
7 a 14 anos. Destas, espantosos 2,1 milhões, ou 87,2% do
total de iletrados, vão à escola. A proporção diminui com
a idade. Mas é um escândalo que quase a metade (45,8%) dos
analfabetos com 14 anos esteja na escola. “É
inadmissível”, reconhece a secretária de Educação Básica
do Ministério da Educação, Maria do Pilar.
É o retrato de uma falência para a qual contribuem
professores despreparados e sobrecarregados, condições
deploráveis de trabalho, a pobreza das famílias e o
interesse insuficiente dos pais, eles próprios analfabetos
ou pouco mais que isso. Mas o nervo do problema é que “as
escolas simplesmente não sabem o que fazer com as
crianças”, como diz o consultor da Fundação Cesgranrio,
Ruben Klein.
Outro indicador da crise é a chamada defasagem
idade-série. Em 2007, 32% dos alunos do ensino fundamental
não cursavam a série em que deveriam estar. O dado
melhorou em relação a 1997, quando os atrasados
representavam 43% do total. Mas - novamente - o ritmo da
melhoria deixa a desejar. “Os estudantes nessas condições
ainda são muitos”, diz o presidente do IBGE, Eduardo
Nunes. O mesmo raciocínio vale para o nível de
escolarização dos brasileiros com 15 anos ou mais. Em
1997, tinham, em média, 5,8 anos de escola. No ano
passado, 7,3 anos.
Ou seja, levou um decênio para a escolarização
aumentar apenas 1,5 ano - e ficar em um patamar muito
abaixo de países como a Coréia do Sul, cujo nível de vida
em 1960 era semelhante ao do Afeganistão. Sem falar que a
evasão no ensino médio é da ordem de 5 milhões de alunos
por ano - o que reforça o nexo entre educação de
baixíssima qualidade e a escassez de mão-de-obra
qualificada.
Em 2007, para completar, 30% dos brasileiros de 15
anos em diante eram analfabetos funcionais ou analfabetos
totais. Trinta milhões de pessoas no primeiro caso, 14
milhões no segundo.
É ominoso constatar que um terço da geração que
desponta para o mercado de trabalho, por falta de educação
básica adequada, não tem condições de ascensão social. São
cidadãos que dificilmente sairão do nível de pobreza para
a classe média - e muito menos para o grupo privilegiado
dos “10% mais ricos do Brasil”, para o que bastaria a
irrisória renda de 3,5 salários mínimos (R$ 1.452,50). |
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