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Poupança externa não fará o País crescer
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Para Bresser-Pereira, estratégia traz redução da poupança interna, câmbio valorizado, dependência, endividamento e crises
Fernando Dantas para o Jornal O Estado de São Paulo.
O ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira considera desastroso que o Brasil tenha deixado o real se valorizar a ponto de eliminar o superávit em conta corrente, que deve se transformar em déficit em 2008, segundo as projeções do Banco Central (BC). Um país com déficit em conta corrente não consegue fazer com que a sobra do consumo, que é a poupança interna, financie todo o seu investimento. Por essa razão, importa poupança dos outros países.
Esse processo é visto como saudável por muitos economistas, desde que seja trilhado de forma moderada e sem despertar temores de calotes nos financiadores internacionais. Para Bresser, porém, a poupança externa não traz crescimento e, sim, dependência, endividamento, câmbio valorizado, redução da poupança interna e crises. Ele cita países como China, Coréia e Índia, como exemplos de rápido crescimento sem uso da poupança externa. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o sr. vê as projeções de que haverá déficit em conta corrente em 2008, pela primeira vez desde 2002?
É a crônica de uma morte anunciada. Essa tendência estava se anunciando desde meados do ano, e a causa evidentemente é a sobrevalorização da taxa de câmbio. Como estamos no Natal, é época de comemorar. Crescimento de 5% não é nenhuma maravilha, mas para o Brasil é um ano bom, dadas as taxas de crescimento medíocres que temos tido. Mas, evidentemente, não estamos plantando para o futuro, muito pelo contrário.
Por quê?
Porque estamos abrindo novamente o fosso do endividamento externo, do déficit em conta corrente, do crescimento com poupança externa. Aliás, ponha entre aspas, porque crescimento com poupança externa significa não crescer. Isso tudo mostra claramente que o Brasil não tem uma estratégia nacional de desenvolvimento.
O sr. poderia explicar melhor?
A história econômica do Brasil tem um período que termina em 1980, do nacional-desenvolvimentismo, que foi um grande sucesso. Depois houve a crise da dívida externa, nos anos 80, e, a partir de 1990, com a abertura comercial, mas especialmente com a abertura financeira em 1992, o Brasil deixa de controlar as entradas de capitais e passa a adotar o que eu chamo de ortodoxia convencional - a estratégia que é proposta para nós pelos concorrentes lá do Norte. É claro que o Brasil desde então não cresce. Em vez de usar sua estratégia nacional de desenvolvimento, usamos a estratégia que os nossos concorrentes nos dão.
Por que o câmbio valorizado atrapalha o crescimento?
O grande obstáculo dos países em desenvolvimento para crescer é a tendência à sobrevalorização do câmbio. O câmbio artificialmente apreciado tira o estímulo ao investimento no setor industrial na quantidade que você precisa para exportar. Tem de ter também educação, instituições, infra-estrutura, reformas, mas não basta. Se não tiver oportunidade de investimento lucrativo, o país cresce muito menos, porque quem provoca crescimento é o empresário investindo.
Mas o investimento está crescendo a taxas robustas e sendo puxado pelo mercado interno. O empresário não pode investir e produzir para o mercado interno?
Está havendo espaço no mercado interno porque, primeiro, com a valorização cambial os salários aumentam, e isso aumenta o consumo. Em segundo lugar, houve uma melhoria do crédito direto ao consumidor muito grande, desde o ano passado. E, com a queda da taxa de juros, que foi muito boa, o crédito aumentou fortemente para o consumo. Mas quando o câmbio se valoriza, a importação acontece em três etapas. Na primeira, são as commodities - é um produto homogêneo, que tem preço de mercado, e, se o preço fica mais barato lá fora, importa-se. Mas o Brasil importa pouco commodity. Em segundo lugar, importa-se equipamentos. É um cálculo racional feito por empresas. Só no terceiro momento vem a importação de bens de consumo, que é muito mais complicada, porque são produtos de marca, que têm de ter canais de distribuição no varejo. Essa importação também está aumentando, mas não o suficiente. O ano que vem é que vai ser um desastre para a indústria nacional, porque vai aumentar muito mais essa importação de bens de consumo.
Por que o sr. é contra o crescimento com poupança externa?
Nenhum país cresceu com poupança externa. Essa é a forma de ficar dependente e não crescer. A China não cresce com poupança externa, nem a Índia, nem a Coréia. A Coréia, quando cresceu um pouquinho com poupança externa, antes de 1997, foi para a crise. Quando começa a entrar dinheiro, como entre 1994 e 1999 no Brasil, e o que está acontecendo de novo agora, o câmbio se valoriza, os salários aumentam, cresce o consumo e diminui a poupança interna.
Mas não falta poupança interna ao Brasil para crescer?
A história de que o Brasil não tem poupança para crescer é absolutamente falsa. O Brasil tem uma classe capitalista e uma classe média muito grandes. Objetivamente, nos últimos anos, durante os quais não se usou nenhuma poupança externa, o País cresceu bem mais do que nos anos 90, quando se usou muita. Em 1994, tínhamos zero de poupança externa, em 1999 tínhamos 4,32% do PIB, ou seja, este era o déficit em conta corrente. E, nesse período, não aumentou nada a taxa de investimento do País. A conta corrente ficou positiva a partir de 2003 e chegou a mais de 1% de superávit. Isso é exportação de poupança, e era de se esperar que a taxa de investimento caísse, mas não caiu nada. Até aumentou um pouco. Nós mostramos que temos capacidade de poupar.
Por que o câmbio se valoriza?
Há dois motivos fundamentais. Um é a chamada doença holandesa (sobrevalorização por causa da exportação maciça de commodities), que no Brasil não é grave feito na Venezuela ou na Arábia Saudita, mas é suficientemente grave, por causa do café, do ferro, da cana, da soja, da madeira. Isso não dá uma enorme valorização, mas dá alguma, de 20% a 30%, que é mais que suficiente para criar problema. O segundo fator é a atração que juros altos e altas taxas de lucro fazem ao capital estrangeiro, seja investimento direto ou empréstimo.
O que se pode fazer para evitar a valorização cambial?
Tem que controlar a entrada de capitais e o endividamento externo. E tem que neutralizar a doença holandesa, com um imposto sobre exportações dessas commodities supervalorizadas que o País tem em abundância, como fazem o Chile e Argentina. No caso argentino, há o imposto na exportação de soja, carne e trigo, que eles acabaram de aumentar. Com esse imposto, os exportadores não são lucrativos com uma taxa de câmbio mais valorizada do que a que eles têm. Se não fosse o imposto, o câmbio poderia baixar de 3 para 2 pesos por dólar, porque seria lucrativo exportar commodities nesse preço. Mas, com o imposto, você segura o câmbio no nível em que há competitividade das commodities.
O sr. tem elogiado a estratégia da Argentina. Como a compara com o Brasil?
Com exceção de falsificar os números da inflação, que é um vergonha, a estratégia mostra que eles aprenderam que o fator fundamental do processo de desenvolvimento é a taxa de câmbio. E isso apesar da violenta pressão do FMI (Fundo Monetário Internacional) para que eles valorizem o câmbio, o que facilitaria a vida, porque baixaria a inflação. Mas eles estão certíssimos, tiveram um aprendizado muito forte com o desastre causado pelo fato de terem seguido o FMI nos anos 90. Eu acho que a economia brasileira está muito pior do que a argentina hoje. No critério mais importante de todos, que tanto economistas keynesianos (desenvolvimentistas) quanto os ortodoxos acham fundamental,que é garantir a disciplina fiscal, a deles está muito melhor que a nossa - eles têm superávit e nós temos déficit público de 2%. Estão muito melhor do que nós também no câmbio. Só estão pior na inflação. Mas a inflação, se você não deixa haver indexação nenhuma, ela volta, baixa, assim que equilibra oferta e demanda. Nós sofremos horrores com a inflação entre 1980 e 1994 por causa da indexação que tínhamos, que deu inércia na inflação. Controlar a inflação é muito importante, mas é alguma coisa que se pode fazer com razoável facilidade.
O sr. tem mais recomendações para o Brasil?
Sim, tem de haver um ajuste fiscal mais duro e tem de se praticar taxas de juros mais baixas. Os juros devem flutuar de acordo com a inflação, mas num nível baixo, e não nesse nível escandaloso do Brasil, que melhorou um pouco nos últimos tempos.
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