As grandes
potências dos descontos agressivos são obrigadas a mudar
-- e a oferecer mais vantagens aos clientes
Por Mariana Durão
EXAME Desde o início dos anos 90, três corporações
americanas se transformaram em ícones do que os
especialistas em marketing chamam de "poder do preço
baixo".
Cada uma à sua maneira, a rede de supermercados Wal-Mart,
a companhia aérea texana Southwest e a fábrica de
computadores Dell ajudaram a criar a mística em torno
dos hard discounters -- empresas que, graças ao poder de
compras em escala gigantesca e à estrutura extremamente
enxuta, são capazes de oferecer produtos e serviços por
preços muito abaixo da média. Com um apelo irresistível
ao bolso do consumidor, Wal-Mart, Southwest e Dell
tornaram-se casos de estudo de especialistas de
marketing e tiveram suas estratégias copiadas por
empresas do mundo inteiro.
Agora, essas mecas do preço baixo começam a rever suas
fórmulas vencedoras em seu principal mercado, os Estados
Unidos. O motivo é prosaico. Os rivais que sobreviveram
ao massacre promovido por essas empresas não apenas
aprenderam com elas como melhoraram seus modelos. Assim,
parte das vantagens competitivas dos pioneiros
simplesmente evaporou e os resultados pioraram. Em 2006,
a Southwest teve queda de 9% nos lucros, enquanto uma
nova concorrente, a AirTran, ganhou o dobro do
registrado em 2005.
No mesmo período, os lucros da Wal-Mart cresceram 0,5%.
Os da Target, 15%. "O que essas companhias estão
tentando é uma fórmula híbrida, em que o formato de
descontos é complementado com vantagens que não
existiam", diz o consultor Alberto Serrentino, sócio da
Gouvêa de Souza Associados, consultoria de São Paulo
especializada em varejo e consumo.
Mudar uma fórmula de sucesso, em empresas de
qualquer porte, exige coragem e determinação. Numa
companhia gigantesca, com vários níveis hierárquicos e
opiniões de todo tipo, esse esforço é ainda maior. A
rede Wal-Mart, maior corporação do mundo, com
faturamento de 351 bilhões de dólares em 2006, é o
melhor exemplo dessas dificuldades.
A empresa tenta reverter a queda no ritmo de crescimento
das vendas de suas lojas nos Estados Unidos,
principalmente as abertas há menos de um ano -- um
indicador importante do setor de varejo. Enquanto em
2005 as novas lojas apresentavam crescimento mensal de
3,6%, em 2007 o índice não passou de 1,5%. Parte desse
desempenho se deve à pressão de redes como Costco e
Target, que também mantêm o apelo do baixo custo, mas
oferecem produtos mais sofisticados e marcas de
prestígio. Há um ano, o Wal-Mart tentou mudar de perfil
-- instalou até sushi bar e área wi-fi nas lojas.
A estratégia foi um fiasco. Os clientes de renda mais
alta não compareceram e os compradores tradicionais
rejeitaram as novidades. A rede voltou a focar os
preços, mas passou a investir também em serviços nas
lojas, como clínicas médicas onde os consumiores podem
passar por consultas mais baratas. "É um caminho de
longo prazo até conseguirmos acertar esse novo modelo",
diz o vice-presidente de marketing do Wal-Mart, Stephen
Quinn.MUDANÇAS DE TAL
PORTE e com tamanho impacto raramente nascem
espontaneamente. A regra é mudar apenas quando a
situação se agrava de tal forma que não haja
alternativa. Antes que isso aconteça, e de maneira
acertada, as gigantes do preço querem se antecipar a
esse cenário. Desde que foi fundada por Michael Dell, em
1984, a fabricante de computadores Dell caracterizou-se
pela produção e venda de máquinas confiáveis e de baixo
preço, o que a transformou na maior fabricante de PCs do
mundo.
Boa parte desse sucesso decorre de um sistema de venda
direta que elimina a intermediação de varejistas e
distribuidores -- e derruba os custos. Desde o ano
passado, quando a empresa perdeu a liderança mundial do
setor para a HP, seus executivos experimentam novos
formatos. Para enfrentar a concorrente, a Dell fechou
contratos com grandes varejistas e investiu também em
produtos mais caros. Da mesma forma, os executivos da
companhia de aviação Southwest Airlines, uma das
primeiras a adotar o modelo de baixo custo, não
titubearam -- mesmo diante de todos os riscos -- em
subver-ter a idéia básica sobre a qual o negócio foi
construído. A Southwest tem uma política tão espartana
que em seus vôos não há lugar marcado. Escolhe o assento
quem chega primeiro.
A empresa acaba de criar uma espécie de classe executiva
estilo low cost. Por uma taxa extra de 30 dólares, os
passageiros têm mordomias como o direito de embarcar
antes dos demais e se sentar nos melhores lugares do
avião.
Apesar do forte simbolismo, as alterações
realizadas por Wal-Mart, Dell e Southwest não significam
que o modelo de baixo custo esteja comprometido. Na
verdade, a busca pelo menor preço se tornou uma
tendência irreversível e a cada dia entram mais
empre-sas nessa disputa.
As três gigantes enfrentam o que os especialistas chamam
de "ônus do pioneirismo". Depois de criar mercados e um
novo conceito de venda no mundo dos negócios, seus
modelos foram intensamente copiados por velhos e novos
concorrentes. Agora, elas precisam transformar o formato
que as consagraram para garantir a mesma dianteira
confortável do passado. "O modelo de preços baixos só
tende a crescer", diz o analista Caio Dias, do banco
Santander. "E, se todo mundo oferece preço baixo, é
preciso diferenciar-se de outra maneira."
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