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Uma escala Richter para os mercados


Eric Dash, The New York Times - O Estado de São Paulo
 
É tentador usar a velha metáfora do terremoto para falar sobre as crises financeiras. Que outra maneira seria melhor para descrever a devastação econômica - os tremores do mercado de hipotecas, o colapso sísmico do Lehman Brothers e os abalos secundários que repercutiram na Europa?

Mas alguns acadêmicos estão considerando seriamente essa metáfora, adotando um novo enfoque da economia que intitulam de "econofísica". Uma área nova que representa uma ruptura com a teoria tradicional, em que os terremotos financeiros são estudados da mesma maneira que os geólogos estudam aqueles em terra firme. "São necessários novos enfoques para encontrarmos soluções no caso de desafios práticos e fundamentais enfrentados pelo nosso sistema social, econômico e financeiro", declarou um grupo de econofísicos em uma carta aberta ao investidor George Soros.

Os macroeconomistas constroem teorias refinadas para explicar como entendem as crises. Para os econofísicos, os mercados são muito mais complexos e confusos - a ponto de a beleza e a lógica da teoria econômica serem insuficientes. Eles acreditam que, aproveitando os instrumentos das ciências naturais, examinando um enorme conjunto de dados para classificar seu conteúdo, conseguirão trabalhar com dados passados para encontrar a dinâmica subjacente dos abalos econômicos e se preparar para o próximo.

É difícil prever crises financeiras, dizem os econofísicos, porque os mercados não são eficientes, como acreditam os economistas tradicionais, nem se regulam ou se corrigem automaticamente. Os transtornos periódicos resultam de uma cascata de eventos e de uma reação cíclica, muito semelhantes aos movimentos tectônicos.

Os cientistas descobriram que os terremotos, naturais e financeiros, têm padrões similares. Pequenas e sutis oscilações do mercado são ocorrências regulares às quais se presta pouca atenção: choques extremos são muito raros. Assim também ocorre com os terremotos.

Os terremotos econômicos também desencadeiam tremores secundários perigosos. Do mesmo modo que geofísicos japoneses, no século 19, descobriram que tremores secundários ocorrem bem depois de um primeiro e forte abalo, os sismólogos dos mercados de ações identificaram um padrão similar nos choques financeiros.

"Se você analisá-los, a lei dos terremotos se encaixa perfeitamente", diz H. Eugene Stanley, professor de física da Universidade de Boston. "Um grande tremor provoca abalos secundários menores e depois outros cada vez mais fracos."

As crises ocorrem em cadeia. A crise monetária na Tailândia na década de 90 foi seguida por problemas similares na Indonésia e Coreia do Sul. Depois da falência do Lehman Brothers, Washington Mutual, Wachovia e muitos outros bancos de menor porte caíram como dominós.

Efeito cascata. Alguns econofísicos, como também economistas e políticos, sugerem que a confusão recente na Europa foi causada pelos efeitos prolongados do pânico de 2008 dos EUA.

Os terremotos financeiros mudaram radicalmente o ambiente. A repentina liberação de energia na crosta terrestre cria ondas sísmicas que podem mover montanhas; crises podem levar à reformulação de velhas regras.

Após a Grande Depressão, foi sancionada a Lei Glass-Steagall , com a separação dos bancos comerciais e de investimento. Hoje, na esteira da crise, os legisladores realizaram a maior revisão dos regulamentos do setor financeiro desde os anos 30.

"Grandes terremotos mudam o panorama", disse Didier Sornette, professor de geofísica que dirige o Financial Crisis Observatory, em Zurique. "Grandes colapsos mudam as regras, a percepção do risco e a psicologia das pessoas." Mas, como se verifica na ciência aplicada aos terremotos, nossa compreensão das crises também é primitiva.

Os sismólogos conseguem monitorar a rotação diária da Terra ao longo da Falha de San Andreas, na Califórnia, e sabem que a possibilidade de um terremoto devastador dentro de 30 anos é superior a 99%. Mas não conseguem localizar quando ou onde ocorrerá.

Os terremotos financeiros são ainda menos previsíveis. Uma razão é que o mundo real é um sistema complexo, em constante adaptação. Outra razão é que, embora existam limites na energia liberada por um terremoto, não existem restrições a preços. "O mundo físico não consegue nos surpreender amplamente", disse Nassim Taleb, autor de O Cisne Negro, livro sobre a influência de eventos altamente improváveis. "O mundo financeiro sim."

Lições. Se as crises são difíceis de ser antecipadas, alguma coisa pode ser feita para evitar os danos? As lições aprendidas com os terremotos são instrutivas.

Após o grande terremoto de 1906, arquitetos e engenheiros reformularam os códigos de construção para San Francisco, para os edifícios resistirem mais. Do mesmo modo, as recentes reformas das regras para o setor financeiro têm por objetivo fortalecer a arquitetura econômica. O que se pretende é que atuem como um amortecedor de choques contra as mudanças bruscas do mercado.

Funcionários do governo sugerem que o conselho de órgãos reguladores do risco sistêmico devem ficar atentos aos primeiros tremores nos mercados, da mesma maneira que os sismólogos.

"Se você tem bons sistemas de monitoramento para terremotos implantados, pode se prevenir e evacuar a população caso um tsunami esteja para ocorrer", disse Alan Krueger, economista chefe do Departamento do Tesouro dos EUA.

Ou se precaver para uma próxima erupção dos mercados. A Comissão de Valores Mobiliários americana (SEC) pediu a um físico nuclear para investigar as causas de uma queda abrupta em maio, quando a Bolsa de Nova York despencou e se recuperou rapidamente.

"Podemos ter instituições saudáveis, mas ainda assim podem ocorrer grandes terremotos financeiros se as políticas que o governo vem adotando forem desequilibradas", disse Lowell Bryan, sócio da McKinsey.


 
 

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